domingo, 23 de novembro de 2008

E SE OBAMA FOSSE AFRICANO?

Estimados(as) Amigos(as),
Hoje, o silêncio do Querubim Peregrino é quebrado...
Enviaram-me, esta semana, o texto que abaixo partilho convosco, principamente aqueles(as) em cujo coração mora a Esperança pelo engrandecimento do bom Povo Africano.
É um desabafo de um Africano, simples, sincero e amante do seu Povo com o qual, infelizmente, concordo inteiramente.
Mas, a Esperança permanece....
"Os africanos rejubilaram com a vitória de Obama. Eu fui um deles.
Depois de uma noite em claro, na irrealidade da penumbra da madrugada, as lágrimas corriam-me quando ele pronunciou o discurso de vencedor.
Nesse momento, eu era também um vencedor.
A mesma felicidade me atravessara quando Nelson Mandela foi libertado e o novo estadista sul-africano consolidava um caminho de dignificação de África. Na noite de 5 de Novembro, o novo presidente norte-americano não era apenas um homem que falava. Era a sufocada voz da esperança que se reerguia, liberta, dentro de nós.
Meu coração tinha votado, mesmo sem permissão: habituado a pedir pouco, eu festejava uma vitória sem dimensões. Ao sair à rua, a minha cidade se havia deslocado para Chicago, negros e brancos respirando comungando de uma mesma surpresa feliz.
Porque a vitória de Obama não foi a de uma raça sobre outra: sem a participação massiva dos americanos de todas as raças (incluindo a da maioria branca) os Estados Unidos da América não nos entregariam motivo para festejarmos. Nos dias seguintes, fui colhendo as reacções eufóricas dos mais diversos recantos do nosso continente. Pessoas anónimas, cidadãos comuns querem testemunhar a sua felicidade.
Ao mesmo tempo fui tomando nota, com algumas reservas, das mensagens solidárias de dirigentes africanos. Quase todos chamavam Obama de "nosso irmão".
E pensei: estarão todos esses dirigentes sendo sinceros?
Será Barack Obama familiar de tanta gente politicamente tão diversa?
Tenho dúvidas.
Na pressa de ver preconceitos somente nos outros, não somos capazes de ver os nossos próprios racismos e xenofobias.
Na pressa de condenar o Ocidente, esquecemo-nos de aceitar as lições que nos chegam desse outro lado do mundo. Foi então que me chegou às mãos um texto de um escritor camaronês, Patrice Nganang, intitulado: " E se Obama fosse camaronês?".
As questões que o meu colega dos Camarões levantava sugeriram-me perguntas diversas, formuladas agora em redor da seguinte hipótese: e se Obama fosse africano e concorresse à presidência num país africano?
São estas perguntas que gostaria de explorar neste texto. E se Obama fosse africano e candidato a uma presidência africana? 1. Se Obama fosse africano, um seu concorrente (um qualquer George Bush das Áfricas) inventaria mudanças na Constituição para prolongar o seu mandato para além do previsto.
E o nosso Obama teria que esperar mais uns anos para voltar a candidatar-se.
A espera poderia ser longa, se tomarmos em conta a permanência de um mesmo presidente no poder em África.
Uns 41 anos no Gabão, 39 na Líbia, 28 no Zimbabwe, 28 na Guiné Equatorial, 28 em Angola, 27 no Egipto, 26 nos Camarões.
E por aí fora, perfazendo uma quinzena de presidentes que governam há mais de 20 anos consecutivos no continente.
Mugabe terá 90 anos quando terminar o mandato para o qual se impôs acima do veredicto popular. 2. Se Obama fosse africano, o mais provável era que, sendo um candidato do partido da oposição, não teria espaço para fazer campanha. Far-Ihe-iam como, por exemplo, no Zimbabwe ou nos Camarões: seria agredido fisicamente, seria preso consecutivamente, ser-Ihe-ia retirado o passaporte. Os Bushs de África não toleram opositores, não toleram a democracia. 3. Se Obama fosse africano, não seria sequer elegível em grande parte dos países porque as elites no poder inventaram leis restritivas que fecham as portas da presidência a filhos de estrangeiros e a descendentes de imigrantes.
O nacionalista zambiano Kenneth Kaunda está sendo questionado, no seu próprio país, como filho de malawianos.
Convenientemente "descobriram" que o homem que conduziu a Zâmbia à independência e governou por mais de 25 anos era, afinal, filho de malawianos e durante todo esse tempo tinha governado 'ilegalmente".
Preso por alegadas intenções golpistas, o nosso Kenneth Kaunda (que dá nome a uma das mais nobres avenidas de Maputo) será interdito de fazer política e assim, o regime vigente, se verá livre de um opositor. 4. Sejamos claros: Obama é negro nos Estados Unidos.
Em África ele é mulato.
Se Obama fosse africano, veria a sua raça atirada contra o seu próprio rosto.
Não que a cor da pele fosse importante para os povos que esperam ver nos seus líderes competência e trabalho sério. Mas as elites predadoras fariam campanha contra alguém que designariam por um "não autêntico africano".
O mesmo irmão negro que hoje é saudado como novo Presidente americano seria vilipendiado em casa como sendo representante dos "outros", dos de outra raça, de outra bandeira (ou de nenhuma bandeira?). 5. Se fosse africano, o nosso "irmão" teria que dar muita explicação aos moralistas de serviço quando pensasse em incluir no discurso de agradecimento o apoio que recebeu dos homossexuais.
Pecado mortal para os advogados da chamada "pureza africana". Para estes moralistas – tantas vezes no poder, tantas vezes com poder - a homossexualidade é um inaceitável vício mortal que é exterior a África e aos africanos. 6. Se ganhasse as eleições, Obama teria provavelmente que sentar-se à mesa de negociações e partilhar o poder com o derrotado, num processo negocial degradante que mostra que, em certos países africanos, o perdedor pode negociar aquilo que parece sagrado - a vontade do povo expressa nos votos.
Nesta altura, estaria Barack Obama sentado numa mesa com um qualquer Bush em infinitas rondas negociais com mediadores africanos que nos ensinam que nos devemos contentar com as migalhas dos processos eleitorais que não correm a favor dos ditadores. Inconclusivas conclusões Fique claro: existem excepções neste quadro generalista. Sabemos todos de que excepções estamos falando e nós mesmos moçambicanos, fomos capazes de construir uma dessas condições à parte. Fique igualmente claro: todos estes entraves a um Obama africano não seriam impostos pelo povo, mas pelos donos do poder, por elites que fazem da governação fonte de enriquecimento sem escrúpulos. A verdade é que Obama não é africano. A verdade é que os africanos - as pessoas simples e os trabalhadores anónimos - festejaram com toda a alma a vitória americana de Obama. Mas não creio que os ditadores e corruptos de África tenham o direito de se fazerem convidados para esta festa. Porque a alegria que milhões de africanos experimentaram no dia 5 de Novembro nascia de eles investirem em Obama exactamente o oposto daquilo que conheciam da sua experiência com os seus próprios dirigentes.
Por muito que nos custe admitir, apenas uma minoria de estados africanos conhecem ou conheceram dirigentes preocupados com o bem público. No mesmo dia em que Obama confirmava a condição de vencedor, os noticiários internacionais abarrotavam de notícias terríveis sobre África.
No mesmo dia da vitória da maioria norte-americana, África continuava sendo derrotada por guerras, má gestão, ambição desmesurada de políticos gananciosos.
Depois de terem morto a democracia, esses políticos estão matando a própria política. Resta a guerra, em alguns casos. Outros, a desistência e o cinismo. Só há um modo verdadeiro de celebrar Obama nos países africanos: é lutar para que mais bandeiras de esperança possam nascer aqui, no nosso continente.
É lutar para que Obamas africanos possam também vencer.
E nós, africanos de todas as etnias e raças, vencermos com esses Obamas e celebrarmos em nossa casa aquilo que agora festejamos em casa alheia."
Autor: Mia Couto

20 Comentários:

Blogger Verena Sánchez Doering disse...

me alegra porfunadamene que hayas vuelto amiga
se te ha extrañado mucho
solo desearte que todo este bien y tu estés muy bien
muchos cariños y mi abrazo grande con mucho cariño
mil besitos y cuidate


besos y sueños

23 de novembro de 2008 às 03:54  
Blogger A. João Soares disse...

Cara Maria Faia,
Uma descrição da África muito completa feita pela mão de quem a conhece em profundidade.
O continente mais atrasado precisa de uma evolução rápida para recuperar a distância aos mais evoluídos. Mas, para isso, precisa de governantes, a todos os níveis, com sentido de Estado e generosidade, gerindo os interesses das populações com dignidade,seriedade e honradez.
Beijos
João

23 de novembro de 2008 às 06:43  
Blogger Isamar disse...

"A verdade é que os africanos - as pessoas simples e os trabalhadores anónimos - festejaram com toda a alma a vitória americana de Obama. Mas não creio que os ditadores e corruptos de África tenham o direito de se fazerem convidados para esta festa. Porque a alegria que milhões de africanos experimentaram no dia 5 de Novembro nascia de eles investirem em Obama exactamente o oposto daquilo que conheciam da sua experiência com os seus próprios dirigentes."

Estou de acordo com Mia Couto. Os mais simples, o povo africano, está com Obama, festejaram a vitória de Obama, choraram por Obama mas o mesmo não acontece com a maior parte dos seus governantes. Se Obama fosse africano,seria um mulato africano, discriminado,persona non grata para assumir a chefia de um Estado. Ainda há muito racismo, muita xenofobia, num mundo que não passa de uma aldeia no Universo onde estamos inseridos.Lamentável!
Um post para reflectir.

Espero que este seja o primeiro de muitos. Tenho saudades tuas.Muitas!
Beijinhos

23 de novembro de 2008 às 06:54  
Blogger Elvira Carvalho disse...

Primeiro que tudo saúdo o seu regresso. Já tinhamos saudades.
Depois o texto está muito bom e só podia ter escrito por quem conhece muito bem o chão que pisa.
Africa, é uma terra maravilhosa. A natureza foi pródiga com a grande maioria dos seus países, não só em beleza, mas também, em riqueza. Pena que essa riqueza seja para meia dúzia de ditadores e seus cães de fila, e a grande maioria dos africanos viva na maior miséria, quando não ainda em regime de quase escravidão.
Um abraço

23 de novembro de 2008 às 12:07  
Blogger Elvira Carvalho disse...

Parece que o seu blog está em conflito comigo. Já é o terceiro comentário que vou escrever.
E diz-me sempre que o pedido levou muito tempo. Vou voltar de tarde não vá que algum deles tenha passado.
Até logo

23 de novembro de 2008 às 12:10  
Blogger tulipa disse...

MINHA QUERIDA MARIA FAIA

FINALMENTE...A TUA PRESENÇA AQUI
para nos ofereceres um belo texto de quem? Pois, quem havia de ser?
MIA COUTO.

Só ele sabe escrever assim, só ele sabe dizer as verdades na hora certa; SEMPRE...MIA COUTO.
Meu AMIGO DE INFÂNCIA.

Não há nada mais fascinante e cativante do que conhecer in loco novas culturas.
Assim o fiz mais uma vez.
Sou uma privilegiada, Deus tem sido meu Amigo por me proporcionar momentos tão magníficos.
Consegui realizar mais um sonho na minha vida.

Noutras áreas a coisa não corre muito bem, mas a Esperança é a última a morrer, continuo diariamente na luta por aquilo que quero, hei-de conseguir.

Beijinhos.
Boa semana.

Também regresso HOJE depois de 12 dias ausente.

23 de novembro de 2008 às 13:53  
Blogger MGomes disse...

Bonito regresso! E logo com um texto do sempre universal, Mia Couto!

Bjo

24 de novembro de 2008 às 08:10  
Blogger Carminda Pinho disse...

Uma boa maneira de recomeçar...:)

Beijos

25 de novembro de 2008 às 04:19  
Blogger Agulheta disse...

Maria Faia. Adorei o regresso, e nada melhor que este tema.Africa terra do sofrimento e luta,mas de um povo sofrido e muita dor,espero que com a vitória de Obama, os povos africanos possam ser mais livres de ditadores lhes tem matado a alma. Fico feliz pelo regresso.Beijinho

25 de novembro de 2008 às 21:37  
Anonymous Anónimo disse...

Passei e deixo saudações amigas

26 de novembro de 2008 às 17:47  
Blogger Meg disse...

Maria Faia,
Eu queria, eu sabia que um dia estarias de volta. É por isso com muita alegria e amizade que te dou as boas vindas.
E vieste com um texto do Mia Couto que já conhecia, mas que, como sabes, diz muito do escritor que todos conhecemos - principalmente os que já sentiram o cheiro daquela terra molhada...
Mais um texto imperdível e uma análise a reter.

Um abraço muito amigo

26 de novembro de 2008 às 19:09  
Blogger Elvira Carvalho disse...

Amiga, passei para deixar um abraço e um muito obrigada.

27 de novembro de 2008 às 22:24  
Blogger Jorge P. Guedes disse...

Estimada amiga.

No meio dos meus sentires, encontrei hoje um tempinho para visitar alguns amigos, tal como a Maria Faia encontrou para outros.

Não vou comentar, por falta de tempo, este tão longo escrito.

Peço por isso desculpa e deixo-lhe o meu abraço e congratulações pelo seu regresso ao activo.

Jorge P.G.

1 de dezembro de 2008 às 18:09  
Blogger Jorge P. Guedes disse...

Passo hoje com um pouquinho mais de tempo e para lhe dizer que nunca estive em África, pelo que me é difícil entender certo "sentir africano".
Não vou contestar Mia Couto, mas parecem-me exagerados alguns dos seus conceitos aqui documentados.

Quanto a Obama, não creio que ele se sinta "um africano". Parece-me até bem americano!

Um abraço e espero que o seu regresso não se tenha ficado por um simples episódio.

10 de dezembro de 2008 às 13:20  
Blogger Meg disse...

Maria Faia,
Estou surpreendida com a tua ausência... só espero que esteja tudo bem contigo.
Voltei a ler o Mia e acho que ele tem razão... de África sabem os que lá estão ou que por lá passaram e conhecem a mentalidade da maioria dos altos dirigentes quando no poder.

Conto "ver-te" em breve.

Um abraço

15 de dezembro de 2008 às 20:31  
Blogger elvira disse...

Passei amiga. Deixo um abraço e desejos de BOAS FESTAS

18 de dezembro de 2008 às 22:57  
Blogger - Moisés Correia - disse...

Para vós amigos… de reflexão,
uma natividade de prosperarão
e um ano novo também,
de rostos risonhos,
com realizações de vossos sonhos…
Num vislumbrar de um novo mundo
poetizar a paz e harmonia
cantando todos de mãos dadas
na sintonia da alegria.

Um Bom Natal.

21 de dezembro de 2008 às 16:31  
Blogger António Inglês disse...

Vim oferecer-lhe uma árvore de natal!

Quisera Senhor, neste Natal, armar uma árvore
dentro do meu coração e nela pendurar em vez de
presentes, os nomes de todos os meus amigos.
Os amigos de longe e de perto. Os antigos e
os mais recentes. Os que vejo a cada dia e os
que raramente encontro. Os sempre lembrados
e os que às vezes ficam esquecidos.

Os constantes e os intermitentes. Os
das horas difíceis e nos das horas alegres,
os que sem querer, eu magoei, ou,
sem querer me magoaram. Aqueles a quem
conheço profundamente e aqueles de quem não me
são conhecidos , a não ser as aparências. Os que
pouco me devem e aqueles a quem muito devo. Meus
amigos humildes a meus amigos importantes. Os nomes
de todos os que já passaram pela minha vida.

Uma árvore
de muitas raízes muito profundas para que seus nomes nunca
mais sejam arrancados do meu coração. De ramos muito extensos,
para que novos nomes vindos de todas as partes, venham
juntar-se aos existentes. De sombras muito agradáveis
para que nossa amizade, seja um aumento de repouso nas lutas
da vida.
Que o natal esteja vivo dentro de nós em cada dia do ano
que se inicia, para que possamos viver sempre o amor
e a fraternidade.

Um Santo e Feliz Natal. Que 2009 seja melhor que 2008 que não deixa saudades.

António Inglês

21 de dezembro de 2008 às 18:21  
Blogger Isamar disse...

Desejo-te um Natal cheio de saúde, amizade, pão na mesa, harmonia, amor...
Que o Ano Novo te traga tudo quanto desejas.

Mil beijinhos

22 de dezembro de 2008 às 18:02  
Blogger C Valente disse...

Nesta vida nem tudo o que parece é
Saudações amigas com votos de Boas Festas, com saúde, paz e amizade

22 de dezembro de 2008 às 21:56  

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